domingo, 28 de setembro de 2008

PARA ALÉM DO PÓRTICO: RETRATOS DA ESCRITA DO CANDIDATO AO INGRESSO NA UNIVERSIDADE.


Autora: Profa. Dra. Ormezinda Maria Ribeiro-Aya

RESUMO:
Neste artigo apresentamos o resultado de um trabalho de pesquisa e de extensão realizado pela equipe de avaliação dos processos seletivos da Universidade de Uberaba, enfocando a ênfase dada ao texto narrativo e os resultados obtidos a partir da alteração, em 2000, da proposta de produção de texto no Processo de Ingresso por Avaliação Seriada da Universidade de Uberaba-PIAS no sub-programa 2000/2003.

ABSTRAT:
In this article we present a work of research and extension carried through for the team of evaluation of the selective processes of the University of Uberaba, focusing the emphasis given to the work with the narrative text and the results gotten from the alteration, in 2000, of the proposal of production of text in the Process of Ingression for Seriada Evaluation of the University of Uberaba-PIAS in subprogram 2000/2003.



UM RETRATO DOS PROCESSOS SELETIVOS


À medida que trabalhávamos com a avaliação das redações dos candidatos a vagas nos diversos cursos da Universidade de Uberaba, no Programa de Ingresso por Avaliação Seriada-PIAS, percebemos que seria bastante produtivo, não só para a tarefa de selecionar, mas para a continuidade do trabalho de desenvolvimento da expressão escrita do ingressante, durante a sua vida acadêmica, um olhar mais atento para os textos produzidos pelos candidatos. Decidimos, então, desenvolver uma pesquisa, com ênfase no processo de construção desses textos, ao longo das três etapas do PIAS, considerando também como instâncias desse processo a elaboração das instruções para a redação e a construção das propostas .
Assim, passamos a analisar os textos produzidos pelos candidatos, com um outro olhar, não apenas com o objetivo de atribuir uma nota a essas produções, mas também fazendo um levantamento de procedimentos, estratégias e recursos lingüísticos utilizados pelos candidatos, para construir seus textos. Essa análise resultou na elaboração de um material que pode orientar os interessados (candidatos e escolas conveniadas), por meio de um diálogo mais concreto entre a equipe de correção das redações e a comunidade, uma vez que se pôde explicitar os conhecimentos acerca da construção do texto escrito avaliados nas redações dos candidatos a Uniube, pelo PIAS, no periódico “Dialogando com o PIAS”.
A partir do levantamento das dificuldades de expressão escrita dos candidatos, reveladas nos seus próprios textos, dos comentários feitos pela equipe avaliadora das redações e pelos professores das redes pública e privada da comunidade, que participaram dos encontros de integração e de extensão, promovidos pela coordenação do PIAS, foi realizada uma sistematização dos dados coletados, fundamentada num referencial teórico consistente, que sustenta uma concepção de linguagem, caracterizada como processo de interação.
Esse trabalho possibilitou que se constatasse a necessidade de alterar alguns aspectos do processo. O primeiro diz respeito às opções de propostas de produção de textos das avaliações do PIAS. Esse programa, iniciado em 1998, oferecia três propostas de redação, na avaliação de cada etapa: a) dissertação; b) narração; c) carta argumentativa. Todavia, observamos que, mesmo com a diversidade de propostas, aproximadamente 70% dos candidatos optavam pela dissertação nas três etapas e, em relação ao critério autoria e expressividade, apenas 30% dos candidatos conseguiam uma pontuação acima da média geral dos candidatos, em redação.
Em face desses dados, a equipe de elaboração e correção das redações promoveu um encontro com professores do Ensino Médio de Uberaba e região, no qual pôde verificar que o trabalho com a produção de textos, nas escolas, dava-se basicamente com textos dissertativos, sob a justificativa de que essa era a tipologia cobrada em todos os processos seletivos, incluindo-se o ENEM. Considerando essa informação e o perfil ideal dos alunos que a Universidade de Uberaba espera receber, para o ingresso nos cursos de graduação, a equipe entendeu que as propostas de redação deveriam conter outras opções, de modo a permitir que o candidato demonstrasse a habilidade de produzir textos das diversas tipologias, com criatividade e autoria.
Assim, a partir de 2000, definiu-se que, na primeira etapa, o candidato poderia optar entre três propostas, porém, de uma única tipologia, a narrativa. Essa alteração visava garantir que o candidato pudesse mostrar capacidade de elaborar textos adequados, em relação a todas as categorias desse tipo de texto, fugindo das frases estereotipadas, palavras-chave e expressões feitas, típicas de início de parágrafos, comuns nos textos dissertativos. Em relação à segunda e terceira etapas, decidiu-se que seria mantida a oferta de três opções, que continuasse a contemplar a narração, a dissertação e a carta argumentativa.
A equipe de avaliação das redações do PIAS entende que a verdadeira porta de entrada da Universidade não é o seu imponente pórtico, que figurativiza o ingresso, mas o processo seletivo, que de fato autoriza o candidato a fazer o curso de sua escolha, caso seja selecionado.
A redação, nos processos seletivos da Universidade de Uberaba, ocupa um lugar privilegiado, porque foi concebida como a carta de apresentação do candidato ao ingresso à Universidade. Em outras palavras, é a senha para se adentrar no campus. Nesse exercício de redigir, o candidato mostra sua habilidade de refletir por escrito sobre uma dada situação, de exprimir-se com clareza, de organizar suas idéias, de estabelecer relações, de ler e de interpretar dados e fatos, além de elaborar hipóteses, bem mais do que simplesmente dominar os conteúdos aprendidos no ensino médio ou no cursinho pré-vestibular.
Conforme já mencionado anteriormente, o fato de os candidatos, em sua maioria, optarem pela dissertação, chamou a atenção da equipe. Na análise dos dados, obtidos a partir de estatísticas sistematizadas pelo Núcleo de Informática da instituição, verificou-se que, no item autoria e expressividade, o desempenho dos candidatos ficava abaixo da média geral.
Ao entrarmos em contato com a comunidade, durante os cursos de extensão promovidos pela Universidade, com o intuito de dialogar com professores do Ensino Médio, constatamos que, nas últimas séries do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, no que se refere à redação, dá-se ênfase ao texto dissertativo, sob a alegação de que os vestibulares privilegiam esse modo de organização textual.
Se de um lado há o argumento de que professor ensina porque os processos seletivos cobram, de outro, os processos cobram porque a escola ensina. Percebemos, então, que seria oportuno propor a quebra de um ciclo, já vicioso. Assim, decidiu-se que, se o candidato, na primeira etapa, tivesse necessariamente que fazer uma narrativa, na segunda e na terceira etapas, poderia optar por repetir essa tipologia, fazer uma dissertação ou, ainda, uma carta argumentativa.
Desse modo, as escolas seriam levadas a se preocupar com o ensino do texto narrativo, deslocando a centralidade do trabalho de produção de textos do texto dissertativo, do que ocupa as aulas de, no mínimo, sete anos da escolaridade básica.

EM DESTAQUE AS NARRATIVAS

Se o que se pretende é um aluno criativo, reflexivo, capaz de propor soluções, “capaz de fazer uso de sua condição de agente e senhor da linguagem nas suas mais variadas possibilidades de realização”, conforme destaca Ribeiro, (2002, p. 311), então o próprio processo de seleção e as aulas de Língua Portuguesa, nas escolas de educação básica, devem propiciar uma avaliação que oportunize ao candidato manifestar suas habilidades e competências de produção de textos de diversas tipologias textuais. Por essa razão, entende-se que as avaliações das redações no PIAS não devem se limitar a um simples julgamento, a partir do qual se proceda a uma classificação e distribuição de vagas, de acordo com o resultado final, mas devem constituir-se num instrumento que possibilite a interpretação do perfil do ingressante, de modo a subsidiar as ações de extensão que visem alcançar o aluno do ensino fundamental e médio.
Assim, a equipe de avaliação das redações do PIAS entende que esse procedimento implica fazer um diagnóstico, que não pode ser realizado num momento pontual, principalmente porque se trata de um processo gradual de ingresso. Por isso, um outro momento, posterior à “correção” propriamente dita dos textos produzidos em cada etapa, em que se procura identificar os problemas de expressão escrita dos candidatos torna-se fundamental para que seja possível, a partir da definição do perfil desses candidatos, apontar pontos do processo de desenvolvimento da habilidade de escrever, que carecem de intervenção pedagógica.
Portanto, a avaliação que tem início nas diferentes etapas do processo seletivo para ingresso na Universidade de Uberaba estende-se a outras instâncias de análise, tornando-se objeto de estudo dos professores da área de linguagem do Instituto de Formação de Educadores que integram a equipe do PIAS.
Quando analisamos as produções dos candidatos ao ingresso por avaliação seriada, não estamos somente exercitando uma ação classificatória que implica, ao mesmo tempo, inclusão de uns e exclusão de outros, mas almejamos ações mais amplas que alcancem não só a comunidade recém ingressante, mas também aqueles que futuramente pretendem se candidatar a uma vaga na Universidade, aos professores de língua portuguesa das escolas de educação básica e, ainda, qualquer pessoa que queira aprender a empregar adequadamente a língua materna.
Desse modo, definiu-se como objetivos dessa instância do trabalho de avaliação das produções escritas dos alunos que se candidataram a uma vaga na UNIUBE, pelo PIAS:
• oportunizar um diálogo entre a equipe de avaliação das redações dos Programa de Avaliação Seriada- PIAS, e a comunidade escolar em geral: professores, alunos e pais;
• estabelecer um elo entre ensino, pesquisa e extensão, fornecendo material de análise e estudo para o Instituto de Formação de Educadores, mais especificamente para os alunos e professores dos cursos de Letras;
• evidenciar os critérios, linhas teóricas e práticas que norteiam o trabalho da equipe responsável pela avaliação das redações da Universidade de Uberaba, enfatizando a sua transparência e seriedade;
• propiciar uma auto avaliação do trabalho da equipe, delineando possíveis propostas de mudanças;
• estabelecer um diagnóstico mais preciso do processo de avaliação das redações, bem como das habilidades e competências de expressão escrita já desenvolvidas pelos egressos da educação básica, a partir da análise dos textos produzidos, nesse processo;
• fornecer subsídios aos professores da área da linguagem desta universidade e de outras escolas, especialmente as de educação básica, para auxiliá-los a superar os problemas identificados e alcançar uma qualidade nova no trabalho pedagógico com os textos e a linguagem;
• divulgar os resultados do trabalho de pesquisa que se inicia na preparação das provas de redação dos processos seletivos, passa pela avaliação da redação produzida no momento da avaliação e se estende a outros momentos de estudo e análise dessas produções.
Com vistas a alcançar um dos principais objetivos de nosso trabalho, a equipe definiu como ponto de partida, proceder à análise dos textos narrativos produzidos pelos candidatos. Para tal, é necessário que se conheça o texto narrativo, sob o ponto de vista de sua produção e funcionamento discursivo, com base na idéia de que um texto se define por sua finalidade situacional, isto é, todo ato de linguagem tem uma intencionalidade e se submete a condições particulares de produção, o que exige do usuário da língua determinadas estratégias de construção textual. Numa abordagem mais geral sobre os mecanismos de elaboração textual, com base nos conceitos de coesão e coerência, o trabalho pedagógico de produção do texto de base narrativa deve partir dos seguintes pontos:
a. o texto de base narrativa apresenta um seqüência de fatos reais ou imaginários, tendo, portanto, como fundamento, as ações e as pessoas que delas participam;
b. os tempos verbais e os advérbios marcadores de tempo e espaço são elementos essenciais para a coesão e a coerência do texto de base narrativa, permitindo a ordenação temporal referencial dos fatos enumerados;
c. existem características lingüísticas próprias ao texto de base narrativa, que o diferenciam de outros tipos de textos;
d. a estrutura narrativa é a base de determinados gêneros literários, como a epopéia, o romance, a novela, o conto;
e. ao lado das características narrativas, um texto pode apresentar traços de outras modalidades interagindo com a narração.
Um texto narrativo tem como objeto fatos reais ou imaginários. Numa notícia, por exemplo, narram-se fatos reais, apresentados como tal; nos contos, novelas, romances, narram-se acontecimentos fictícios ou acontecimentos reais apresentados ficcionalmente. Constitui-se, então, de uma série de fatos, que se situam em um espaço e se sucedem no tempo: os fatos narrados não são simultâneos, como na descrição, havendo mudança de um estado para outro, segundo relações de seqüencialidade e causalidade. Ele expressa as relações entre os indivíduos, os conflitos e ligações afetivas entre esses indivíduos e o mundo, utilizando situações que contêm essa vivência.
Pode-se identificar um texto como narrativo quando nele há mudança de um estado para outro, há transformação. Essas transformações se processam por meio de recursos lingüísticos, dentre os quais alguns merecem destaque o uso preferencial de alguns tempos e modos verbais, o uso de advérbios e expressões adverbiais, o uso de um vocabulário mais concreto, a presença de sujeito mais determinado e a evidência de relações de anterioridade, posterioridade ou concomitância entre os fatos narrados.
Há, num texto narrativo, dois modos básicos de ordenar os tempos: em relação ao momento da fala e em relação a um marco temporal localizado no texto. Com relação ao momento da fala, o acontecimento pode ser concomitante, anterior ou posterior. A cada uma dessas possibilidades corresponde, em princípio, um tempo verbal, respectivamente, presente, pretérito perfeito e futuro do presente (modo indicativo). A expressão da posterioridade pode se realizar, também, pela forma do presente, para dar maior expressividade à narração. Com relação a um marco temporal instaurado no texto, a ordenação dos tempos e modos é mais detalhada. Quando há um marco temporal no passado, os fatos podem ser concomitantes, anteriores, ou posteriores a ele. Se há um marco temporal no futuro, os fatos podem ser concomitantes, anteriores ou posteriores a esse marco. Portanto, fica claro que cada tempo verbal utilizado em um texto narrativo tem uma função, uma finalidade coesiva, sendo responsável pela progressão da ação.
A organização do tempo pode se realizar também por meio do uso de advérbios e de expressões adverbiais, que são empregados em relação ao momento da fala e em relação ao tempo focalizado no texto. Nos dois casos, esse momento pode ser anterior, posterior ou concomitante, mas é claro que advérbios relacionados ao momento da fala não devem se mesclar a advérbios referentes ao tempo focalizado no texto, pois isto prejudicaria a coesão da estrutura narrativa.
Pelas suas próprias características de contar fatos que se sucedem num determinado tempo e espaço, expressando relações e conflitos entre indivíduos, o texto narrativo em geral apresenta um vocabulário mais concreto e um sujeito mais determinado. Informações do espaço, dos personagens e seus sentimentos podem ocorrer sob a forma de descrição, ocupando o segundo plano da narração. Estudiosos como Labov (1972) e Hopper (1979), apontam, em um texto narrativo, dois planos distintos que se complementam. Um é formado por um conjunto de enunciados que expressam fatos encadeados no tempo; o outro plano é constituído por enunciados que enxertam e acrescentam informações mais detalhadas àquilo que está sendo narrado.
O que torna um texto inteligível, passível de interpretação, é a presença de elementos que assegurem sua compreensão por parte de quem o ouve ou lê. Esses elementos estão relacionados aos conceitos de coerência e coesão. É devido à coerência que um texto apresenta uma unidade de sentido. A coerência é profunda, ou seja, não se evidencia na superfície do texto, porque é essencial ao sentido do texto. A coesão se apresenta de forma explícita, através de marcas lingüísticas - sintáticas, gramaticais e semânticas. Por isso, há estudiosos para os quais "a coesão é a maneira como os constituintes da superfície textual se encontram relacionados entre si, através de marcas lingüísticas. Já a coerência tem como fundamento a continuidade de sentidos, dizendo respeito ao modo como os componentes do mundo textual são mutuamente acessíveis e relevantes." (BEAUGRANDE E DRESSLER, 1981).
Sabe-se que a estrutura narrativa, por ser uma seqüência de fatos relacionados entre si, apresenta uma ordem temporal e uma ordem causal. Um texto, para ser coerente, não precisa, necessariamente, ser rigoroso na apresentação linear dos acontecimentos; estes podem contrariar uma ordem temporal e ser apresentados de forma original, por meio de retornos no tempo.
À medida que o texto narrativo vai sendo desenvolvido, seu autor precisa estar atento aos elementos com que constrói sua história, criando personagens consistentes, que se movimentam num determinado cenário, motivados por determinados desejos ou objetivos. Os elementos essenciais de uma narrativa são o enredo, ou seja, é uma seqüência de acontecimentos que ocorrem com determinadas pessoas ou personagens, num determinado lugar; os personagens, que são seres inventados, fictícios ou não, que se movimentam, se relacionam e dão lugar à trama que se estabelece na ação; o narrador, em outras palavras, a voz que conta a história - pode ser o próprio autor, ou pode ser uma invenção, uma personagem, principal ou secundária; e o espaço, que diz respeito às condições materiais ou espirituais em que se movimentam os personagens e se desenvolvem os acontecimentos. Esses elementos estão intrinsecamente relacionados, isto é, nunca atuam separadamente, colaborando sempre para a unidade do conjunto. Percebe-se, normalmente, que um ou outro desses elementos aparece realçado, é manipulado, por exigência do próprio enredo, como recurso para causar um determinado efeito no leitor. Assim, algumas vezes, o tempo da narrativa não obedece a uma seqüência normal, aparecendo as ações em ordem cronológica, mas, antes, sabe-se primeiro o fim da narrativa, para depois, aos poucos, sermos informados dos fatos que antecederam aquele desfecho; outras vezes, o narrador joga com o espaço, tornando-o indefinível ou extremamente delimitado, ou, ainda, variando-o muito e misturando-o nas lembranças das personagens.
De posse desse referencial, a equipe pôde partir para a análise dos dados coletados nas produções dos candidatos.


RETRATOS DA ESCRITA: UMA ANÁLISE PRELIMINAR


Ao “forçarmos” a escola a trabalhar com o texto narrativo, dando-lhe o devido destaque, quebramos o círculo vicioso que se apresentava sistematicamente da Escola Básica para os processos seletivos do Ensino Superior e dos processos seletivos para a Escola Básica.
O discurso que se fundamentava na figura do círculo vicioso como na propaganda de um biscoito, na TV: “é fresquinho por que vende mais, ou vende mais por que é fresquinho?” perdeu a razão de ser, pois houve uma ruptura nesse processo. Uma vez que o PIAS passava a cobrar, na primeira etapa, a produção de uma narrativa, apenas com a possibilidade de escolha entre três temas, a escola se viu “obrigada” a trabalhar essa tipologia, durante as aulas, no primeiro ano do Ensino Médio e o candidato, por sua vez, pôde escolher uma das três propostas, a partir da segunda etapa, porém, com a oportunidade de ter aprendido a redigir uma narrativa.
Os quadros, a seguir, demonstram essa ruptura no círculo e uma significativa elevação na pontuação atribuída pelas bancas avaliadoras, no que tange ao critério autoria e expressividade.

QUADRO 1
Processo Seletivo PIAS- PROGRAMA DE INGRESSO POR AVALIAÇÃO SERIADA
Ano 1999 2000 2001
Etapa Dissertação Narração Carta Narração Narração Narração Narração Narração Narração
1ª Etapa Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
220 54,06 148 36,36 37 36,6 191 34,6 179 32,42 182 32,97 329 36,88 190 21,30 373 41,81
2ª Etapa Dissertação Narração Carta Dissertação Narração Carta Dissertação Narração Carta
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
133 68,21 38 19,48 24 12,31 236 74,29 39 12,38 40 12,69 179 40,68 205 46,59 56 12,72


3ª Etapa Dissertação Narração Carta Dissertação Narração Carta Dissertação Narração Carta
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
116 75,32 24 15,59 14 9,09 312 89 19 5,45 17 4,88 282 78,99 53 14,85 22 6,16



QUADRO 2
Processo Seletivo PIAS- PROGRAMA DE INGRESSO POR AVALIAÇÃO SERIADA
Ano 2000 2001 2002
Etapa Narração Narração Narração Narração Narração Narração Narração Narração Narração
1ª Etapa Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
191 34,6 179 32,42 182 32,97 329 36,88 190 21,30 373 41,81 324 42 265 34,39 182 23,7
2ª Etapa Dissertação Narração Carta Dissertação Narração Carta Dissertação Narração Carta
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
236 74,29 39 12,38 40 12,69 329 36,88 190 21,30 373 41,81 226 55,40 137 33,57 45 11
3ª Etapa Dissertação Narração Carta Dissertação Narração Carta Dissertação Narração Carta
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
312 89 19 5,45 17 4,88 329 36,88 190 21,30 373 41,81 203 67 74 24,42 26 8,58



Análise de Desempenho dos candidatos por critério de correção das redações


ETAPA
1º CRITÉRIO: ADEQUAÇÃO AO TEMA PROPOSTO
2º CRITÉRIO: ADEQUAÇÃO AO TIPO DE TEXTO
3º CRITÉRIO: ADEQUAÇÃO À MODALIDADE ESCRITA CULTA
4º CRITÉRIO: COERÊNCIA E COESÃO TEXTUAL
5º CRITÉRIO: AUTORIA E EXPRESSIVIDADE

Um dos fatores mais significativos que se observou foi o aumento da escolha pela proposta B- narração, na segunda etapa/2001 (46,59%). Esses candidatos, no ano anterior, realizaram a prova do PIAS/ primeira etapa em que se ofertavam três propostas de narração. Já os candidatos da terceira etapa/2001, que não passaram pela experiência da opção por três propostas de narrativa, na primeira etapa, apenas 14.85% escolheram a narração e 78.99% a dissertação. Contudo, muitos ainda são os candidatos que acreditam que, para se aventurarem a escrever um texto narrativo é preciso ter a verve de um poeta, ou a inspiração de um artista.
A intenção do trabalho da equipe é mostrar que uma narrativa pode apresentar um processo de ordenação de idéias e argumentação acerca de um ponto de vista tão lógico quanto a dissertação, bastando saber articular os elementos que compõem uma narrativa.
Outro dado importante, observado na análise das redações, refere-se à carta argumentativa que, apesar de possibilitar ao candidato um conhecimento do destinatário com quem poderia dialogar, a clareza dos objetivos de seu texto e a oportunidade de exercitar seu posicionamento de cidadão face aos problemas sociais existentes, teve um índice mínimo de escolha, na segunda e terceira etapas, nas provas de todos os anos. Em 2001, segunda etapa, apenas 12.72% dos candidatos escolheram a proposta C- carta argumentativa e, na terceira etapa, apenas 6.16% .
Com relação ao quinto critério- autoria e expressividade que, em 1999, nas três etapas, apenas 30% conseguiram nota acima da média, observou-se uma melhora significativa nos candidatos de primeira e segunda etapas em 2001, candidatos esses que passaram pela alteração proposta na primeira etapa: três narrativas. É importante observar que, na primeira etapa, 52.50% dos candidatos ficaram com as notas acima da média. Apenas na proposta B - narração, em todas as etapas, os candidatos obtiveram nota acima da média.
Quanto ao critério “Adequação ao tipo de texto”, pode-se verificar que apenas 59,50% dos candidatos obtiveram notas acima da média, na avaliação de 1ª etapa. Por outro lado, nas 2ª e 3ª etapas, observa-se que 62,99% e 68,32% ficaram com as notas acima da média. Esse dado revela que os alunos possuem menos conhecimentos acerca da estrutura e elementos do texto narrativo, única possibilidade de escolha, na 1ª etapa e, por isso, o seu desempenho foi pior. Acredita-se que esse resultado aponta uma necessidade de a escola ajustar-se, em relação ao trabalho pedagógico com a produção do texto narrativo, para que os alunos aprendam a construí-lo, com mais proficiência.

DO OUTRO LADO DO PÓRTICO

A análise das redações dos candidatos revelou que a maioria ainda não se apropriou satisfatoriamente dos elementos que compõem o texto narrativo. Percebeu-se que muitos não conseguem realizar o encadeamento temporal e/ou de causa e conseqüência entre os fatos do texto; alguns não são capazes de construir a história, mantendo-se fiel ao enredo do texto e, por isso, acabam por tangenciarem o tema; outros demonstram certa dificuldade em relação à definição do espaço de sua narrativa e cometem alguns equívocos que afetam, inclusive, a coerência do texto. Entretanto, essa nova proposta, apenas com textos narrativos na primeira etapa, abriu uma possibilidade aos candidatos de produzirem textos mais criativos e diferentes do comum, elevando o índice do percentual de avaliação da primeira etapa, principalmente no que se refere ao critério autoria e expressividade, bem como aos aspectos de coesão e até mesmo da coerência. Uma vez que as propostas de produção de textos do PIAS passaram a cobrar, na primeira etapa, apenas a produção de uma narrativa, anulando a possibilidade de escolha de outros tipos de textos, como ocorria, percebeu-se que as escolas de ensino médio, conveniadas com esse programa de ingresso por avaliação seriada, conforme já foi dito anteriormente, iniciaram ou intensificaram o processo de trabalho pedagógico com a narração, nas aulas da área da linguagem, no primeiro ano do Ensino Médio. Em conseqüência, nota-se que os alunos começam a desenvolver a habilidade de redigir esse tipo de texto, o que se pode verificar na melhora de seu desempenho em redação, na avaliação da primeira etapa.

REFERÊNCIAS

ABREU, Antonio Suárez. Curso de Redação. São Paulo, Ática, 1990.
BEAUGRANDE, R. & DRESSLER, W. (1981) Introduction to Text Lingüistics. London: Longman.
FIORIN, José Luiz e SAVIOLI, Francisco Platão. Para entender o texto. São Paulo, Ática,1991.
GARCIA, Othon M. Comunicação em prosa moderna. Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1973.
KOCH, Ingedore V. e TRAVAGLIA, Luiz Carlos. A coerência textual. São Paulo, Contexto, 1990.
_________. Texto e coerência. São Paulo, Cortez, 1989.
KOCH, Ingedore. A inter-ação pela linguagem. São Paulo, Contexto, 1997.
_________.A coesão textual. São Paulo, Contexto, 1990.
RIBEIRO, Ormezinda Maria. O papel da gramática no ensino de língua materna. Ou por que nossos alunos não sabem português. Revista Athos & Ethos, Uberlândia MG, v. 02, p. 299-324, 2002.
TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Um estudo textual-discursivo do verbo no português do Brasil. Tese de Doutorado. UNICAMP, 1991. Mimeo.

Artigo publicado originalmente em:

RIBEIRO, O. M. . Além do pórtico: retratos da escrita do candidato ao ingresso na universidade. Revista Athos & Ethos, Patrocínio, v. 05, p. 259-276, 2005.

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